Provações, expiações e resgates coletivos
Provações, expiações e
resgates coletivos
Essa reflexão apoia-se em alguns textos da Codificação Espírita,
de Allan Kardec, e da literatura complementar espírita que tratam de provações,
expiações e resgates coletivos, os quais, por vezes, são difíceis de
compreender as suas causas diante de situações extremamente chocantes aos olhos
humanos.
De vez em quando, vemos acidentes, tragédias, flagelos e resgates
coletivos sem entender o porquê de tanto sofrimento e a razão de arrastar
pessoas consideradas boas para esses desastres, ou de envolver os que se
conhecem ou não.
Para a Doutrina Espírita, as partidas coletivas têm suas razões de
ser, podendo ser vários os motivos conforme as circunstâncias envolvidas.
Uma das justificativas estaria na relação de causa e efeito, em
que o passado delituoso e desconhecido de certas pessoas, com os mesmos
débitos, atua no presente e no futuro de forma individualizada e coletivamente,
provocando provações, expiações e resgates comuns.
Há de se considerar que as leis divinas regem o indivíduo, a
família, a nação, as raças e o conjunto dos habitantes dos mundos, que formam
individualidades coletivas solidárias. Portanto, existem faltas do indivíduo,
da família, da nação, e cada uma, qualquer que seja o seu caráter, expia em
virtude da mesma lei.
Essas faltas solidárias são expiadas coletivamente pelos
indivíduos que para elas concorreram, os quais se encontram de novo reunidos
para sofrerem juntos a pena, ou para terem ensejo de reparar o mal que
praticaram, socorrendo e assistindo aqueles a quem outrora maltrataram.
Assim, a solidariedade ocorre pelo laço social, conectando-se
passado, presente e futuro, pois que as mesmas individualidades se reuniram,
reúnem e reunirão para subir juntas a escala do progresso, auxiliando-se
mutuamente.
Além disso, independentemente do atual nível de evolução da
pessoa, a justiça divina não deixará de atingir o faltoso do passado para a
hora de sua expiação, pois o estágio de progresso presente não exclui as
provações que foram escolhidas e aceitas como complemento dessa expiação. Por
isso, muitas desgraças parecem imerecidas, quando somente vemos o presente.
Ademais, a justiça das provações não decorre dos atos da vida
presente, porque há de se reconhecer que elas são o resgate das dívidas do
passado.
A esse respeito, um exemplo a destacar é o que ocorreu com João
Batista, o maior dos profetas, considerando-se as perseguições ocorridas e a
morte por decapitação a que foi alvo.
Em “Estudo Aprofundado da Doutrina Espírita, no livro I, Cristianismo
e Espiritismo, Módulo II, Roteiro 3 - João Batista - o precursor,
encontramos uma explicação acerca da decapitação de que João Batista sofreu: “Em
virtude da lei de causa e efeito, sabemos que não há efeito sem causa. Por
conseguinte, para que João Batista sofresse a pena de decapitação é porque
ainda tinha dívidas de encarnações anteriores a pagar. Apesar do alto grau de
espiritualidade que tinha alcançado, João teve de passar pela mesma pena que
infligira aos outros. De fato, se João Batista era Elias, poderemos ver nessa
decapitação o saldo da dívida que tinha contraído quando, como Elias, mandou
decapitar os sacerdotes de Baal. É Justiça Divina que se cumpre, nada deixando
sem pagamento.”
Nesse contexto, diferentes tipos de pessoas poderão estar em um
resgate comum, reunidos em face dos seus compromissos individuais e coletivos
perante as leis de Deus.
Outra justificativa é a de transformar mais rapidamente o espírito
da massa, livrando-a das más influências e o de dar maior ascendência às ideias
novas, porquanto já maduros para a transformação, é que muitos partem, a fim de
se retemperarem em fonte mais pura. E, ao regressarem, acharão mudadas as
coisas e experimentarão a influência do novo meio em que houverem nascido.
Longe de se oporem às novas ideias, constituir-se-ão seus auxiliares.
O Espírito Emmanuel, no livro O Consolador, na psicografia
de Francisco Cândido Xavier, em “Provação”, nas questões de 246 a 250,
esclarece acerca de provação, expiação e como se processa a provação coletiva.
Em suas respostas, Emmanuel esclarece que: “provação é a luta
que ensina ao discípulo rebelde e preguiçoso a estrada do trabalho e da
edificação espiritual. A expiação é a pena imposta ao malfeitor que comete um
crime. (...) Na provação coletiva verifica-se a convocação dos Espíritos
encarnados, participantes do mesmo débito, com referência ao passado delituoso
e obscuro. O mecanismo da justiça, na lei das compensações, funciona então
espontaneamente, através dos prepostos do Cristo, que convocam os comparsas na
dívida do pretérito para os resgates em comum, razão por que, muitas vezes,
intitulais, ‘doloroso acaso’, as circunstâncias que reúnem as criaturas mais
díspares no mesmo acidente, que lhes ocasiona a morte do corpo físico ou as
mais variadas mutilações, no quadro dos seus compromissos individuais.”
Desse esclarecimento, podemos inferir que expiação é a
manifestação da lei de causa e efeito em decorrência de faltas anteriormente
cometidas, em que toda elas representam dívidas contraídas que deverão ser
pagas, cedo ou tarde.
Já as provações são situações educativas da vida, que evidenciam
os cuidados de Deus para com todos nós, oferecendo-nos benditas oportunidades
de progresso moral e espiritual.
Allan Kardec, no livro Obras póstumas, em “Questões e
problemas: As expiações coletivas”, traz luz no tocante à justiça de Deus que,
às vezes, pode tardar, mas não deixa de atingir os faltosos.
Desse texto, destaca-se que, embora possamos ter uma existência
honrosa no momento, ela não exclui as provações, mesmo aqueles mais elevados e
esclarecidos que, hoje, repugnam atos de barbárie cometidos nos tempos de
menosprezo pela vida do outro, ou, quando poderoso, eliminava o fraco
impiedosamente, dentre outras tantas ações que fizeram sucumbir vítimas por
acidentes isolados ou por catástrofes coletivas.
Nesse sentido, a distinção entre as responsabilidades decorrentes
das faltas individuais ou coletivas explica certos fatos ainda desconhecidos,
mostrando a solidariedade existente entre seres e gerações.
Importante ressaltar, ainda, as relações existentes entre os seres
humanos que, de maneira geral, renascem “no mesmo meio, na mesma nação, na
mesma raça, quer por simpatia, quer para continuar, com os elementos já
elaborados, estudos começados, para se aperfeiçoar, prosseguir trabalhos
encetados e que a brevidade da vida não lhe permitiu acabar. A reencarnação no
mesmo meio é a causa determinante do caráter distintivo dos povos e das raças.
Embora melhorando-se, os indivíduos conservam o matiz primário, até que o
progresso os haja completamente transformado.” (Allan Kardec. Obras
póstumas)
Por conseguinte, não é difícil de entender a solidariedade
existente entre famílias, cidades, nações e raças que, no passado, dominadas
por sentimentos inferiores, enveredaram por mau caminho e fizeram coletivamente
o que um indivíduo faz isoladamente. A solidariedade é fato que assenta numa
lei universal da Natureza, ligando os seres do passado, do presente e do
futuro, cujas consequências não se pode subtrair.
Esse fenômeno de progresso, arrastando as massas ao mesmo tempo,
transforma-se em instrumento de regeneração pelos erros e prejuízos de um
passado que tem de desaparecer.
Por fim, citam-se alguns ensinamentos de Léon Denis, no livro O
problema do ser, do destino e da dor, no Capítulo IX - Evolução e
finalidade da alma e no Capítulo X – A morte: “... a vida do ser
consciente é uma vida de solidariedade e liberdade. Livre dentro dos limites
que lhe assinalam as leis eternas, faz-se o arquiteto do seu destino. O seu
adiantamento é obra sua. (...) Quanto mais sobe, tanto mais se sente viver e
sofrer em todos e por todos. Na necessidade de se elevar a si mesmo, atrai a
si, para fazê-los chegar ao estado espiritual, todos os seres humanos que
povoam os mundos onde viveu.”
Assim, a plenitude da consciência moral e espiritual conduz a
trabalhar por nós mesmos e pelos nossos semelhantes, segundo os princípios
divinos da lei de educação geral que rege as condições das nossas vidas, quer
no plano físico como no espiritual.
Pensando nas mortes prematuras, acidentais e das catástrofes que
eliminam numerosas existências humanas, somos conduzidos a reflexões sobre o
sentido da vida para a nossa evolução moral e espiritual. As nossas vidas têm
sentido existencial, segundo os propósitos divinos.
Provas e expiações são meios para
educar o Espírito e agentes de progresso, em que as causas dos sofrimentos
atuais se encontram nas violações do passado, anteriores aos efeitos,
determinando as condições do destino de cada ser, sendo que os benefícios da
dor e do sofrimento alcançam os que sabem compreender as suas ações e os seus
efeitos.
A alma deve conquistar todos os atributos para se
libertar dos sentimentos inferiores, renovar a sua morada e alcançar a
verdadeira felicidade, mas para isso precisa dos obstáculos, das exigências e
das duras lições que provocam os esforços e formam a experiência necessária
para atingir a meta evolutiva.
Nos estágios inferiores da vida, há que se passar
pelas provações e expiações da luta do bem contra o mal dentro do próprio
íntimo, para se adquirir a conscientização necessária para o pleno exercício do
livre-arbítrio e tornar possível o triunfo futuro.
Por isso, viva em função do amor maior, como Jesus amou, na busca
da felicidade duradora, que nem a traça e a ferrugem corroem. Viva por você
mesmo e pelo seu próximo, fazendo a caridade que liberta a alma.
Bibliografia:
EMMANUEL
(Espírito); (psicografado por) Francisco Cândido Xavier. O Consolador. 29ª
Edição. Brasília/DF: Federação Espírita Brasileira, 2019.
DENIS,
León. O problema do ser, do destino e da
dor. 32ª Edição. Brasília/DF: Federação Espírita Brasileira, 2017.
KARDEC,
Allan; tradução de Evandro Noleto Bezerra. A Gênese. 2ª Edição.
Brasília/DF: Federação Espírita Brasileira, 2013.
KARDEC,
Allan; tradução de Evandro Noleto Bezerra. O Céu e o Inferno. 2ª Edição.
Brasília/DF: Federação Espírita Brasileira, 2013.
KARDEC,
Allan; tradução de Guillon Ribeiro. O Livro dos Espíritos. 1ª Edição.
Brasília/DF: Federação Espírita Brasileira, 2019.
KARDEC,
Allan; tradução de Guillon Ribeiro. O Livro dos Médiuns. 1ª Edição.
Brasília/DF: Federação Espírita Brasileira, 2019.
KARDEC,
Allan; tradução de Guillon Ribeiro. Obras póstumas. 41ª Edição.
Brasília/DF: Federação Espírita Brasileira, 2019.
MOURA, Marta Antunes de Oliveira. Estudo
aprofundado da doutrina espírita: Cristianismo e Espiritismo. Orientações
espíritas e sugestões didático-pedagógicas direcionadas ao estudo do aspecto
religioso do Espiritismo. 1ª Edição. Brasília/DF: Federação Espírita
Brasileira, 2017.

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